domingo, 30 de março de 2008

Loucura

Sou uma invenção.
Uma criação sem muito nexo.
Sou uma imaginação de mim mesma.
Eu me imaginei,me criei, me denotei.
Inventei meus gestos,
meus sonhos,meus sabores,
e executei-os.

Cortei alguns excessos,
reli o rascunho,
revisei os erros e
engavetei-me.

Não achei uma boa criação.
Nem era tão autêntica.
Tinha mesclas de poetas
e enlaces de vivências
dissipadas.

Era irrefutavelmente passional,
e também prolixa.
Tinha muita realidade e diversos paradoxos
que fugiam das métricas
e das rimas.

A invenção,repentinamente,
não parecia muito inventada.
Engraçado...Era realmente
semelhante a imagem do espelho.

Mas,oras,eu mesma não inventei
também a imagem do espelho?
E, eu mesma, também
não coloquei esse espelho nesse cenário?

A criação engavetada
começava a invadir-me a mente
-que eu já nem sei se é minha
ou inventada por mim mesma-.

Creio ter começado a me perder
dentro da minha própria narração.

Segurei a primeira mão que vi na frente
e fui tomar um café
-bem forte e bem quente-
tentando descobrir se
a narradora é autora,
ou se tudo é inventado.
Se há algo que una
todos esses pedaços
e torne todos eles
mais crentes,
menos insanos,
mais "gentes".

Loucura.

-ds.

quarta-feira, 26 de março de 2008

Ha tempo...

"Minha alma tem o peso da luz. Tem o peso da música. Tem o peso da palavra nunca dita, prestes quem sabe a ser dita. Tem o peso de uma lembrança. Tem o peso de uma saudade. Tem o peso de um olhar. Pesa como pesa uma ausência. E a lágrima que não se chorou. Tem o imaterial peso da solidão no meio de outros"
-Clarice Lispector.


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Há tempo que eu ando ímpar
Há tempo que eu deixo tudo
Há tempo que eu penso mudo
Há tempo que eu me ausento
de mim, dos outros, do mundo.

Há tempo que eu não rimo,
Há tempo que eu não invento,
Há tempo que eu não ligo,
Há tempo que eu não piro
sobre a vida, sobre as dores,
sobre as crises,sobre as saídas,
sobre os trabalhos,sobre os amores.

Há tempo que eu não danço,
Há tempo que eu não jogo,
Há tempo que eu não me alcanço,
Há tempo que eu só me isolo
dos abraços, dos sorrisos,
das virtudes, dos vícios.

Há tempo que eu não atiço,
Há tempo que eu não "enguiço"
Há tempo que eu não arrisco,
Há tempo que eu não insisto
nos planos,nas paixões,
nas pessoas,nos sonhos, nas imensidões.

Há tempo que eu não despisto,
Há tempo que eu não preconizo,
Há tempo que eu resisto,
as tentações, as contradições,
as tensões, as invenções.

Há tempo
Há tanto tempo
Que eu quase me esqueço
da consistência da minha alma
e do peso do meu credo.

Há tempo
Há tanto tempo
que eu quase me perco
nesse infinito entediante
de dias e horas e anos
vazios.

Há tempo, há tanto tempo
pra se recuperar.
Pra voltar a andar par,
a estar, a rimar,
a inventar, a ligar,
a pirar, a dançar,
a jogar, a alcançar,
a atiçar, a enguiçar,
a arriscar, a acreditar
a despitar, a preconizar
a pecar, a sonhar.

Tem que haver tempo
dentro desse próximo segundo
pra eu me encontrar
dentro dos meus temores absurdos.
Tem que haver tempo
dentro desse próximo segundo
pra eu voltar a ser
essencialmente
humana.

Há de haver tempo...Muito tempo
em um milésimo de segundo
dentro de um olhar,
no qual eu perderei a rima,
a saída, a melodia,
a poesia.

Há de haver,tem de haver
tempo.

-drika.amaral
*Ha tempos sem passear pela minha Roça.